Airton dos Santos*

As desigualdades sociais e econômicas no Brasil são de longe conhecidas, mesmo porque são históricas, não apareceram da noite para o dia. A luta das esquerdas brasileira, tanto no discurso, quanto na prática, sempre foi na direção de amenizar essa situação, tentando diminuir o ‘gap’, principalmente econômico, entre os de cima e os de baixo. Essa luta, também histórica, encontra adversários aguerridos na parte de cima, que resistem a todo custo às tentativas de emancipação política e econômica do povo, condição básica para a conquista da plena cidadania.

Assistimos, embasbacados, o confronto que ora acontece entre as forças progressistas, de um lado, e o contra-ataque conservador e reacionário, de outro. A direita, que não tem vergonha nenhuma de se aliar à extrema-direita, e que possui maioria no Congresso Nacional, controla os grandes meios de comunicação, é proprietária dos bancos e financeiras e domina o agronegócio, constitui uma enorme ameaça às aspirações populares.

O perfil do Presidente, pela terceira vez no cargo, é mais de um reformista, um conciliador, do que de um revolucionário. O Partido dos Trabalhadores, de esquerda, agremiação a que pertence o chefe do executivo, de há muito moveu-se para o centro-esquerda e tornou-se um típico representante da social-democracia europeia no cone-sul da América do Sul.

É isso que somos, uma social-democracia carente de condições econômicas e políticas para fundar, de vez, um estado de bem-estar social. Temos várias indicações dessa vontade, como o SUS (Sistema Único de Saúde), a Política de Valorização do salário mínimo, um sistema de Seguridade Social bem desenhado que, embora desacreditado e combatido pelas elites, provê um mínimo de recursos para os mais necessitados, o Bolsa Família, e aí por adiante. Mas não é o suficiente.

A política conciliatória praticada nos dois primeiros mandatos do Presidente Lula, para todos os fins, foi exitosa, tanto é verdade que ele elegeu seu sucessor, a Presidenta Dilma. Mas as coisas mudaram rapidamente e as forças da extrema direita perderam a vergonha e mostraram a cara. Hoje vivemos outra realidade, e é com ela que temos que lidar. A pressão das forças contrárias é muito grande e obriga o poder central a tomar decisões que, às vezes, atendem mais a elite que o povo.

Um primeiro passo para nos mantermos no caminho do estado de bem-estar social é promover uma reforma que torne nossa estrutura tributária progressiva, que force os mais ricos a pagarem mais impostos e os pobres pagarem menos. Foi a progressividade tributária, acompanhada da ampliação dos serviços públicos e gastos sociais, que reduziram drasticamente as desigualdades na Europa do pós-segunda guerra. A reforma tributária que está sendo encaminhada terá que inverter a lógica da tributação utilizada no país, passando a dar mais peso aos impostos diretos que aos indiretos, tornando o sistema mais justo. Ao invés de desonerar os ricos, é necessário onerá-los na justa medida de suas capacidades de pagar. Isso é distribuição de renda.

Esse é um passo necessário, mas não suficiente. É preciso examinar com cuidado a política de juros do Banco Central, pois no patamar em que se encontram, torna caro os investimentos, impedindo maior crescimento da renda e do emprego. Ao mesmo tempo, prejudica a utilização dos recursos do Estado, pois limita a capacidade de o governo fazer obras públicas de infraestrutura e aplicar os recursos em setores importantes para a economia, inclusive o social e ambiental. Portanto, é necessário que os juros baixem.

Mas, para tomar essas medidas de Política Fiscal (tributos e gastos públicos) e Política Monetária (juros) e harmonizá-las para obter um maior crescimento econômico com distribuição de renda, o governo talvez precise deixar um pouco de lado seu tom conciliador e partir para um embate mais direto contra as correntes contrárias, que jogam para a manutenção do status quo, deixando tudo como está, pois, para eles está tudo bem.

Com tantas forças adversas, representadas no parlamento pela maioria dos deputados e senadores de direita e extrema direita, o Presidente só poderá contar com sua base popular para, livre e democraticamente, vencer as barreiras. O Movimento Sindical precisa estar alertas e perceber a hora de ‘botar o bloco na rua’. Nossa omissão será nossa capitulação.  

Airton dos Santos – Economista

Subseção do Dieese no Sindnapi

Out/24